O Conflito Entre Ser Mulher e Ser Mãe: Feminismo, Tradicionalismo e a Nova Onda de Influenciadoras Tradwives

 


Nos últimos anos, temos assistido a um crescimento significativo do movimento tradwife nas redes sociais, impulsionado por influenciadoras que defendem um retorno à feminilidade tradicional, à submissão ao marido e à centralidade da mulher no lar. Paralelamente, cresce o número de criadoras de conteúdo que ensinam "como ser mais feminina", propagando uma estética e um comportamento baseados na delicadeza, docilidade e dependência financeira do homem. Esse fenômeno não ocorre isoladamente, mas acompanha uma onda conservadora na política global, na qual direitos das mulheres estão sendo contestados e, em alguns casos, revogados. Diante desse cenário, o livro O Conflito: A Mulher e a Mãe, de Élisabeth Badinter, continua sendo uma leitura essencial para entender os dilemas enfrentados pelas mulheres contemporâneas.

Badinter argumenta que a maternidade, ao longo do tempo, foi transformada em um imperativo moral e social, reforçando a ideia de que a mulher só se realiza plenamente ao se tornar mãe. Esse conceito impõe uma série de pressões psicológicas e limita a liberdade de escolha feminina, tornando a maternidade menos uma opção e mais uma obrigação. Com a ascensão de discursos tradicionalistas nas redes sociais, essa pressão se intensifica, fazendo com que mulheres sintam culpa por desejarem carreiras, independência financeira e uma identidade que vá além da maternidade.

A explosão de influenciadoras que ensinam a "ser mais feminina" reforça esse ideal. Mulheres são incentivadas a adotar comportamentos considerados "delicados", a deixar o mercado de trabalho para se dedicarem ao lar e a depender economicamente dos maridos. Embora muitas argumentem que essa seja uma escolha voluntária, críticos alertam para os perigos dessa tendência, que pode resultar em maior vulnerabilidade para as mulheres, especialmente em contextos de violência doméstica e instabilidade financeira.

Ao longo da história, as mulheres lutaram para conquistar direitos como acesso ao mercado de trabalho, autonomia financeira e controle sobre seu próprio corpo. Esse movimento de retorno ao tradicionalismo, ainda que camuflado sob a ideia de liberdade de escolha, pode ser uma armadilha que reforça desigualdades estruturais. Além disso, a romantizarão da feminilidade exagerada muitas vezes ignora o custo invisível do trabalho doméstico e a sobrecarga mental enfrentada por muitas mães.

O retorno da idealização da mulher submissa e maternal não acontece em um vácuo. Nos últimos anos, diversas políticas ao redor do mundo têm ameaçado direitos historicamente conquistados pelas mulheres. Nos Estados Unidos, por exemplo, a revogação do direito ao aborto em diversos estados acendeu um alerta global sobre a possibilidade de retrocessos em direitos reprodutivos. Em alguns países da Europa e da América Latina, discursos nacionalistas e ultraconservadores promovem a ideia da "família tradicional" como única estrutura legítima, desconsiderando os diferentes modelos familiares existentes.

Além das questões políticas, a cultura midiática e religiosa também desempenham um papel importante na disseminação desses discursos. Muitos desses conteúdos reforçam uma visão de que o papel primordial da mulher é servir à família e que qualquer tentativa de emancipação feminina é uma ameaça à estrutura social. Isso cria uma narrativa perigosa que pode impactar as novas gerações, fazendo com que meninas internalizem desde cedo a ideia de que suas ambições pessoais devem ser secundárias em relação à vida familiar.

Essas movimentações reforçam as preocupações levantadas por Badinter: a transformação da maternidade em uma imposição, e não em uma escolha genuína. O embate entre feminismo e tradicionalismo nunca esteve tão evidente, e a leitura de O Conflito é uma ferramenta essencial para compreender os riscos envolvidos e os desafios das mulheres na atualidade.

O dilema entre maternidade e realização pessoal é complexo e subjetivo. Para algumas mulheres, ser mãe em tempo integral é uma decisão satisfatória e gratificante. Para outras, a busca por uma carreira e independência financeira é essencial para sua identidade e bem-estar. O ponto central da obra de Badinter é a necessidade de garantir que essa escolha seja realmente livre e não resultado de pressões sociais, políticas ou econômicas.

O crescimento das tradwives e das influenciadoras que promovem a "feminilidade ideal" evidencia que a luta pela autonomia feminina está longe de acabar. Em um mundo onde o conservadorismo ganha força e políticas públicas ameaçam os direitos conquistados, questionar esses discursos e refletir sobre o impacto dessas tendências é mais necessário do que nunca. O Conflito nos convida a pensar criticamente sobre esses temas e a defender a liberdade de escolha das mulheres, seja qual for o caminho que decidam seguir.

Outro ponto crucial é que a maternidade não deve ser vista como um peso ou uma obrigação, mas como uma experiência que pode ser vivida de diferentes formas. As mulheres devem ter suporte, seja para trabalhar fora, seja para ficar em casa, sem julgamentos ou romanizações que obscurecem as dificuldades da maternidade.

A sociedade precisa reconhecer e valorizar todas as escolhas femininas, desde a decisão de ser uma mãe em tempo integral até a de se dedicar à carreira. O que importa é que as mulheres tenham autonomia para decidir seus próprios caminhos, sem que a maternidade seja imposta como a única via legítima de realização.

E lembre-se: a verdadeira liberdade está em poder escolher seu próprio caminho, sem imposições ou culpas.



Obrigada por ler <3

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